Não existe mito, lenda ou tradição religiosa que não possua a sua serpente, complexo emblema de sabedoria, regeneração e renascimento, embora também de pecado, sedução, ameaça e sexo. A pele que muda, a língua bífida, a mobilidade contorcida, uma venenosa mordedura silenciosamente mortal aliada a uma imensa força trituradora, e um silvo inconfundível, características mais do que suficientes para tornar esta espécie de seres vivos em criaturas de excepção., com a consequente carga de fascínio e medo que a tornam símbolo divino e infernal. Com o formato de cobras foram ilustrados os cabelos de divindades cretenses e bruxas medievais, e na antiga religião egípcia a serpente foi o meio mágico criado por Isis para ressuscitar Ra. Quetzcoatl é a serpente emplumada, o senhor mexicano do céu e da terra. Asclépio e Mercúrio, na mitologia greco-romana, ostentam bastões envoltos por serpentes. Uma cobra consegue roubar ao lendário rei da Suméria, Gilgamesh, a erva da imortalidade, e Adão e Eva são expulsos do paraíso pela acção tentadora instigada em primeira instância pela serpente presente na árvore do pecado original. Na forma de energia subtil, de acordo com o Lama Kundalini, sobe ao longo da coluna vertebral despertando os poderes parapsicológicos do ser humano. Cada grande Mãe da Terra tem a sua própria serpente, mítico antepassado do Homem, e o réptil mordendo a própria cauda representa o círculo, a eternidade do universo..
Os significados antigos são algo controversos, o que faz depender a sua interpretação onírica do respectivo enquadramento numa análise mais complexa e aprofundada. Óptimo presságio nas antigas culturas egípcias, a serpente promete protecção de vária ordem. No Talmud é portadora de riqueza, se for morta é sinal de perda de bens. Os babilónicos consideravam-na presságio de nascimento de um filho com futuro promissor, e se o sonhador pegar nela será muito rico. Na China o sinal de nascimento esperado indicia uma criança do sexo feminino. Na Índia pelo contrário, quem vê em sonhos uma serpente assistirá ao enterro de um filho.
Nos estudos de Artemidoro a cobra está descrita como como anuncio de enfermidades ou de armadilhas, mas ser mordido constitui um presságio muito favorável. Representa o inimigo, por ser venenosa e dissimulada, mas também a fecundidade, a mulher, os filhos, e promete riquezas. A víbora, em particular, encarna a chegada de uma mulher rica à vida do sonhador, trata-se da bela sedutora e astuta, dispensadora dos prazeres amorosos. Lutar com uma cobra constitui um presságio favorável se o sonhador sair vitorioso, caso contrário considera-se desfavorável. O episódio onírico que sugere a presença da pessoa com quem o sonhador mantém uma relação amorosa e esta esconde uma serpente no peito, significa que a seu tempo a mesma será seduzida pelo rival do sonhador, se a personagem em questão demonstra medo significa que irá em breve adoecer, se a serpente desliza contra o seu ventre indicia uma gravidez mal sucedida, e se existe deleite erótico revela infidelidade.
Se no passado a serpente viveu os seus momentos de glória na tradição onírica, actualmente o significado adivinhatório atribui-lhe uma conotação extremamente negativa (onde o episódio relacionado com o pecado original é determinante para as culturas judaico-cristãs), sendo o seu imaginário pleno de ódios e temores, e surgindo como mensageira de inimizades, ingratidão, e de ruína.Apenas alguns intérpretes fiéis às antigas tradições reconhecem nela, se surge com um aspecto benigno, uma promessa de riqueza, ou, fundamentada numa interpretação com base na coloração das escamas, inocência quando é verde, sabedoria quando é branca, de energia espiritual quando azul, e de simples e naturais desejos sexuais quando é castanha. Uma cobra vermelha prevê sempre paixões excessivas, uma negra ou opaca perigos íntimos, uma brilhante ameaças exteriores, e uma cobra preta e amarela aconselha o sonhador a desconfiar dos hipócritas que existem no seu círculo de conhecidos. Uma serpente que se move deslizando ameaça prisão e sedução, o movimento contorcionista adverte para o ódio, enfermidade e inimizade. Vê-la mudar a pele assegura novas energias, matá-la ou comê-la certifica a vitória sobre os inimigos mas também separação de amigos. Segui-la constitui um convite ao sonhador a acreditar nas suas próprias intuições. Encontrá-la inesperadamente sob algum tipo de esconderijo alerta para relações vindouras pouco gratificantes, na cama, pressagia, para o homem, um relacionamento amoroso extremamente negativo. Ser mordido no pé indica desgosto e tristeza, mas se o réptil não é bem sucedido torna-se sinal de invejas detidas. Uma cobra com várias cabeças prediz sedução e traição.
A interpretação psicanalítica relacionada com a imagem onírica da cobra reconhece uma veia de conflitos anormalmente activos entre o consciente e o inconsciente. A serpente representa a libido, a energia sexual e regeneradora, ameaçadoramente incontrolada. Ser mordido equivale assim ao perigo de ser devorado pelos requisitos do Id, o sonhador teme a cobra porque simboliza tudo o que está escondido e seduzido pelo Id. É, com base na falsa regra imposta pela moral que identifica o perigo com o sexo que a serpente é encarada como a personificação do mal, da calúnia e do coito, e se transforma então na sugestão da sua própria forma, o equivalente onírico do pénis, ou da vagina através da circularidade. Uma cobra multicéfala denota a urgência de cumprir com as tarefas da vida.
Os números da cobra da sorte são o 83 e o 88.
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